domingo, 13 de junho de 2010

Quando a única saída é o fim

“O Escafandro e a Borboleta” - Jean-Dominique Bauby (Mathieu Amalric) tem 43 anos, é editor da revista Elle e um apaixonado pela vida. Mas, subitamente, tem um derrame cerebral. Vinte dias depois, ele acorda e descobre que está paralisado: o único movimento que lhe resta no corpo é o do olho esquerdo. Aprende a se comunicar piscando e cria um mundo próprio, contando com aquilo que não se paralisou: sua imaginação e sua memória.

“Mar Adentro” - Ramón Sampedro (Javier Bardem) é um homem que luta para ter o direito de pôr fim à sua própria vida. Na juventude ele sofreu um acidente, que o deixou tetraplégico e preso a uma cama por 28 anos. Lúcido e extremamente inteligente, Ramón decide lutar na justiça pelo direito de decidir sobre sua própria vida, o que lhe gera problemas com a igreja, a sociedade e até mesmo seus familiares.

No último final de semana resolvi assistir ao filme “O Escafandro e a Borboleta”. Eu já tinha lido o livro, mas ainda não tinha tido a oportunidade de ver a película e adorei. Achei perfeita, conforme o livro. Aliás, o filme remeteu-me a outro, muito bom também, chamado “Mar Adentro”. Ambos levaram-me a uma reflexão profunda e contundente.
No início do “O Escafandro...”, o neurologista, Dr. Alain Lepage, explica exatamente o que aconteceu com Jean-Do, sem meias palavras e sem doses anestésicas... “No passado, você provavelmente teria morrido de um derrame. Mas agora as técnicas de reanimação progrediram a ponto de podermos prolongar a vida.” Aí eu pergunto a mesma coisa que Jean-Do pensou: “Isto é vida?”
Ser prisioneira dentro do seu próprio corpo, isso é vida? Vegetar em cima de uma cama, isso é vida? Não poder falar, apenas se comunicar com piscadelas, isso é vida? Sejamos sinceros: isso não é vida!
Não adianta livros de auto-ajuda, orações ao bom Deus, palavras de força e ânimo porque nada disso fará eu mudar de idéia. Prefiro que desliguem as máquinas, prefiro que me libertem, prefiro a saída final e digna. Não quero saber de organizações religiosas pregarem o inferno eterno para mim ou para quem desligar as máquinas, porque nem mesmo o inferno deve ser pior do que ficar vegetando e sentindo os olhares piedosos das pessoas que, por ventura, estarão ao meu lado.
No “O Escafandro...”, Jean-Do não tem nem “direito” de reclamar da “vida” que leva. Ao piscar os olhos e ditar as palavras, o interlocutor logo rechaça o seu momento de desabafo. Já no “Mar Adentro”, Ramón pode soltar toda a sua ira, toda a sua frustração, já que não perdeu a voz.
Nos momentos finais, Ramón deixa, em gravação, o testemunho dos anos "vividos" e sua decisão final, mas não menos sofrida: “Caros juízes, autoridades políticas e religiosas. O que significa para vocês dignidade? Seja qual for a resposta das suas consciências, saibam que para mim isto não é viver dignamente. Eu queria, ao menos, morrer dignamente. Hoje, cansado da preguiça institucional, vejo-me obrigado a fazê-lo às escondidas, como um criminoso. (...) Considero que viver é um direito, não uma obrigação, como foi no meu caso. Forçado a suportar esta penosa situação durante 28 anos, 4 meses alguns dias. Passado este tempo, faço um balanço do caminho percorrido e não me dei conta de ter havido felicidade. Só o tempo que passou, contra a minha vontade, durante a maior parte da minha vida, será a partir de agora o meu aliado. Só o tempo e a evolução das consciências, decidirão algum dia, se o meu pedido era razoável ou não.”
Não ousem pensar que essa saída é a mais fácil, ou que é uma saída covarde, pois não é. Muito pelo contrário, essa saída é a mais difícil, a mais dolorosa e a mais corajosa de todas. É uma saída extremamente racional, mas carregada de emoção.

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O Escafandro e a Borboleta (Le Scaphandre et le Papillon)
Diretor: Julian Schnabel
Atores: Mathieu Amalric , Emmanuelle Seigner , Marie-Josée Croze , Anne Consigny
2007, drama


Mar Adentro (Mar Adentro)
Direção: Alejandro Amenábar
Atores: Javier Bardem, Belém Rueda, Lola Dueñas
2004, drama

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